O cenário perverso da globalização na década de 90 caracteriza-se pela expansão desregulada do capital financeiro, pela manutenção do protecionismo nos países desenvolvidos e pela crescente defasagem tecnológica. Isso afetou de forma mais pronunciada os países da periferia que implantaram as reformas neoliberais e programas radicais de abertura.
Transformaram-se estes países em consumidores de tecnologia, vendedores de ativos para as multinacionais e especialmente vulneráveis a ataques especulativos. Como conseqüência, a dinâmica do mercado de trabalho ficou comprometida e aguçou-se o quadro de concentração da renda e da riqueza. As políticas sociais universais, neste contexto, ficam cada vez mais questionadas num contexto de precarização generalizada do emprego.
Das dez nações com maior número de desempregados, oito encontram-se fora da tríade do poder global. São elas: China, Índia, Brasil, Rússia, Indonésia, África do Sul, Colômbia e Filipinas, segundo o Atlas da Exclusão Social (volume 4, 2004). Mas uma boa parte do problema do mercado de trabalho nestes países se revela sob a forma do trabalho precário e de baixa renda.
Crescimento da informalidade
Ao todo, 520 milhões de pessoas no mundo em desenvolvimento recebem uma renda inferior a US$ 1,00 diário. O setor informal nestas economias torna-se cada vez mais vultoso. Predominam os trabalhadores autônomos eventuais, empregados domésticos e trabalhadores familiares sem remuneração, geralmente excluídos da legislação trabalhista. Nas grandes cidades dos países periféricos, metade dos empregos urbanos é preenchida por trabalhadores autônomos.
Em termos absolutos o total de trabalhadores que recebe uma renda inferior à linha de pobreza vem caindo, o que se deve à contribuição de dois países – China e Índia – em virtude da sua expansão econômica vigorosa e do modelo de inserção ativa no cenário internacional.
Por outro lado, também nos países desenvolvidos, têm sido eliminadas as instituições econômicas e sociais reguladoras dos mercados, o que acarreta a expansão da informalidade e do desemprego. No caso da Europa, as taxas de desemprego aberto mostram-se maiores, de cerca de 9%, que os 5,5% apurados nos Estados Unidos (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE, 2005). Paralelamente, o desemprego de longo prazo – pessoas com mais de um ano nesta situação - atinge 42% dos desempregados na Europa, contra 13% nos Estados Unidos.
Os Estados Unidos possuem uma maior concentração de empregos de baixos salários, uma elevada rotatividade no emprego, destacando-se ainda por apresentarem a maior taxa de pobreza do mundo desenvolvido. Neste país, 27% dos trabalhadores possuem contratos atípicos de trabalho, os quais se caracterizam por jornadas de trabalho irregulares e acesso limitado a benefícios sociais. Para completar, a taxa de sindicalização deste país não supera a casa dos 13%, sustentada neste nível apenas por conta do emprego público (EPI, 2005).
Desemprego, mulheres e jovens
Em termos globais, nos últimos dez anos houve uma elevação no estoque de desempregados de cerca de 35 milhões de pessoas, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT). Nem mesmo o crescimento da economia mundial, acelerado durante a segunda metade da década de noventa, foi capaz de suavizar a crise global do desemprego, já que muitos países da periferia sofreram com os efeitos colaterais das crises financeiras.
O desemprego mundial afeta em maior grau as mulheres e os jovens, sendo a taxa de desemprego feminino 1,4 vez superior à masculina e a taxa de desemprego dos jovens o dobro da taxa de desemprego total em 2005. As desigualdades raciais e de gênero são ainda mais elevadas, especialmente quando se analisam as diferenças de renda, nos setores mais precários do mercado de trabalho.
O quadro de crescente exclusão social nos países do Sul, a ausência de regulação e a gestação de redes globais de comércio e aliciamento de mão-de-obra fazem com que a busca por alta rentabilidade leve a situações de extrema exploração. A OIT estima em 12,3 milhões o número de pessoas vivendo em situação de trabalho forçado, dos quais quase 10% se situam na América Latina.
Quanto ao trabalho infantil, são 5,7 milhões de crianças trabalhadoras na América Latina, o que representa cerca de 3% do total mundial, de pouco menos de 200 milhões. Vale ressaltar ainda que a maior queda do trabalho infantil entre 2000 e 2004 se deu justamente nesta região.
Na América Latina, o quadro econômico e social durante a década de 90 não foi diferente. A região buscou um outro modelo de integração à ordem econômica mundial através da combinação de liberalização econômica com reformas estruturais, dando prioridade a políticas de estabilidade fiscal e de redução da participação do Estado na economia. Como resultado, as taxas de crescimento foram pífias e o setor informal expulsou mão-de-obra, aprofundando-se o quadro de já elevada desigualdade social.
Mesmo com o aumento nos índices da presença das mulheres no mercado de trabalho regional, de 43% em 1990 para 49% em 2002, elas não participam em condições de igualdade com relação aos homens. Recebem remunerações inferiores e necessitam de quatro anos a mais de estudo para obter o mesmo nível de rendimento. A discriminação é ainda mais acentuada para 40% da população da região composta por povos indígenas e pelos afro-descendentes, grupos que apresentam os piores indicadores econômicos e sociais.
Como conseqüência da flexibilização da legislação trabalhista que atingiu vários países da região – especialmente Argentina, Colômbia e Peru – o percentual de trabalhadores com proteção social reduziu-se nesse período de 66,6% para 63,6%. Os trabalhadores menos protegidos concentram-se nas micro e pequenas empresas e em setores como agricultura, mineração, pesca e na construção civil.
O caso brasileiro
A partir dos anos noventa, o Brasil passou a conviver com o desemprego enquanto fenômeno de massa. As taxas de desemprego elevaram-se para homens e mulheres, negros e brancos, analfabetos e “doutores”, pobres e indivíduos da classe média. Paralelamente, a taxa de informalidade elevou-se a patamares impressionantes. Os empregos mais dinâmicos na década foram os sem carteira, seguidos do trabalho doméstico e dos autônomos.
Estes números se aproximam, já que a baixa renda e a informalidade avassaladora levam à não contribuição para previdência, além de dificultar a continuidade dos estudos, forçando muitos dos trabalhadores brasileiros a realizar horas extras ou acumular “bicos” no horário que deveria ser reservado ao lazer.
Finalmente, quando se concentra a análise sobre as desigualdades raciais e de gênero, observa-se que a renda média dos negros é 50% inferior à dos brancos, enquanto as mulheres auferem uma renda média 36% abaixo da percebida pelos trabalhadores ocupados do sexo masculino.
Matéria extraída da Observatório Social em revista nº 10 - maio/2006
Fonte: http://meusalario.uol.com.br/main/trabalho-decente/informalidade/o-trabalho-precario-no-mundo-na-america-latina-e-no-brasil
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