terça-feira, 22 de maio de 2012

O que é o Planejamento Estratégico Situacional?


O Planejamento Estratégico e Situacional, sistematizado originalmente pelo Economista chileno Carlos Matus[1], diz respeito à gestão de governo, à arte de governar. Quando nos perguntamos se estamos caminhando para onde queremos, se fazemos o necessário para atingir nossos objetivos, estamos começando a debater o problema do planejamento. A grande questão consiste em saber se somos arrastados pelo ritmo dos acontecimentos do dia-a-dia, como a força da correnteza de um rio, ou se sabemos onde chegar e concentramos nossas forças em uma direção definida. O planejamento, visto estrategicamente, não é outra coisa senão a ciência e a arte de construir maior governabilidade aos nossos destinos, enquanto pessoas, organizações ou países.
O processo de planejamento portanto diz respeito a um conjunto de princípios teóricos, procedimentos metodológicos e técnicas de grupo que podem ser aplicados a qualquer tipo de organização social que demanda um objetivo, que persegue uma mudança situacional futura. O planejamento não trata apenas das decisões sobre o futuro, mas questiona principalmente qual é o futuro de nossas decisões.
Se tentamos submeter o ritmo do desenvolvimento dos acontecimentos à vontade humana devemos imediatamente pensar que governar em situações complexas exige exercer a prática do planejamento estratégico até seu último grau. Para atingir este objetivo será necessário entender e ultrapassar muitos pré-conceitos em relação à atividade de planejamento no setor público.
Equívocos comuns sobre o conceito e a prática do planejamento:
I. “planejar é uma coisa, fazer é outra...”:  frase utilizada com freqüência para tentar minimizar ou ridicularizar o esforço de planejamento na organização de sistemas.  Esta visão surge normalmente em contextos institucionais que tem precário ou nenhum planejamento, opõe processos supostamente antagônicos mas que, na verdade, são parte de um único momento, é na ação concreta que o plano se decide e prova sua importância. Os métodos de planejamento tradicionais, ao ignorar a variável política, cortaram o caminha para o diálogo entre plano e gestão, relação absolutamente imprescindível para casar o “planejar” com o “fazer”.
II. “o planejamento engessa a organização...”: ao invés da decisão meramente  intuitiva e lotérica, da administração do dia-a-dia, estabelecem-se critérios, metas, objetivos, diretrizes de longo prazo, enfim, o planejamento é um exercício sistemático de antecipação do futuro e é intensivo em gestão. A crítica ao Planejamento como uma “camisa-de-força” normalmente surge das organizações que perdem a base clientelística ou corporativa quando sistemas de planejamento participativo são implantados. Uma organização que pensa e planeja estrategicamente cria condições para o surgimento da liderança baseada na democracia interna e na delegação de autoridade, o monolitismo político e o dirigente autoritário surgem, quase sempre, no ambiente de ausência de planejamento estratégico e participativo.
III. “O Planejamento é um rito formal, falado em código e desprovido de substância...”: este preconceito está muito associado com o próprio elitismo intelectual que o planejamento tradicional e seus defensores construíram ao longo de décadas venerando modelos abstratos e inúteis. Neste caso será sempre verdade o ditado que diz ser o improviso sempre preferível ao planejamento malfeito, isto é, burocrático, formalista. O ritualismo mata o “bom” planejamento e condena à mediocridade dirigentes e funcionários. No mercado das consultorias organizacionais é comum o surgimento de “novas” técnicas e modelos esotéricos de planejamento ou temas afins. As siglas se proliferam e poucas delas tem realmente conteúdo prático e a aplicabilidade necessária. Quando se caminha para níveis cada vez mais abstrato de raciocínio, variáveis cada vez mais agregadas e grandes sínteses políticas é fácil descolar-se da realidade concreta e esta armadilha tem apanhado muitos planejadores. Nesta situação é sempre recomendável associar a intuição e o bom-senso - a expertise que falta para muitos - com as técnicas e modelos racionais adotados em qualquer manual de planejamento.
IV. “o planejamento é obra de  pura técnica, deve ser neutro...”: é evidente que os planejadores devem ter conhecimento técnico mínimo sobre o que planejam. Tais conhecimentos podem ser apreendidos de forma padrão e uniforme, estão acumulados historicamente nos mais diversos setores do conhecimento humano. Entretanto, no setor público especialmente, seria um suicídio “planejado”, fazer planos sem incluir as variáveis de poder e da política na sua concepção e execução. Não existe planejamento neutro, pelo simples fato de que planejar é priorizar e resolver problemas e isto pressupõe uma determinada visão-de-mundo, concepção de Estado, de organização social e assim por diante. Planejar estrategicamente implica necessariamente em manipular variáveis políticas, em situações de poder compartilhado, onde os “outros” também planejam e formulam estratégias. O planejamento que se diz meramente técnico na verdade resulta em simples adivinhação e charlatanismo intelectual.
A superação da visão tradicional requer uma mudança de postura intelectual e governamental, compreender que não cabe ao planejamento predizer o futuro, mas buscar viabilidade para criar o futuro, como uma ferramenta que amplia o arco de possibilidades humanas, um instrumento de liberdade.

[1] Chileno, Carlos Matus foi Ministro do Governo Allende (1973) e  consultor do ILPES/CEPAL  falecido em Dezembro de 1998, ministrou vários cursos no brasil nos anos noventa (Escolas Sindicais, IPEA, Ministérios,  Governos Estaduais e Municipais). Criou a Fundação Altadir com sede na Venezuela para difundir o método e capacitar dirigentes. Introduzido no Brasil a partir do final dos anos oitenta, o PES disseminou-se e foi adaptado amplamente nos locais onde foi utilizado, particularmente no setor público.
[2] Sob a mesma filosofia inspiradora do PES várias outras adaptações metodológicas tem surgido: MAPP – Método Altadir de Planejamento Popular -  é um “resumo” do PES feito por C. Matus, PED – Planejamento Estratégico e Democrático – aplicado por A. K. Sato no Governo Cristóvão Buarque em Brasília –DF, PEP - Planejamento Estratégico Participativo, a partir da experiência do Governo do Rio Grande do Sul, etc...
[3] O “Projeto de Desenvolvimento de Sistema de Suporte ao Planejamento e Gestão”, desenvolvido pelo Laboratório Nacional de Computação Científica (MCT),  desenvolveu produtos informatizados para ajudar a capacitação no método bem como sua aplicação concreta segundo o enfoque do PES (www.lncc.br ).
[4] A  Fundação de Desenvolvimento Administrativo – FUNDAP (www.fudap.sp.gov.br ), vinculada ao Governo do Estado de São Paulo tem editado as principais obras de C. Matus e é um bom centro de referência sobre o tema, possuindo, inclusive um curso regular de Especialização em Ciências e Técnicas de Governo  de inspiração matusiana

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