terça-feira, 29 de novembro de 2011

Gênero e exclusão social

                            

A relação de gênero formada por homens e mulheres é norteada pelas diferenças biológicas, geralmente transformadas em desigualdades que tornam o ser mulher vulnerável à exclusão social. A exclusão que atinge a mulher se dá, às vezes, simultaneamente, pelas vias do trabalho, da classe, da cultura, da etnia, da idade, da raça, e, assim sendo, torna-se difícil atribuí-la a um  aspecto específico desse fenômeno, em vista de ela combina vários dos elementos da exclusão social. Desse modo, mais que qualquer outro assunto ligado ao feminino que se deseja analisar, dificilmente se poderá compreender a exclusão particular da mulher sem antes conhecer o fenômeno da exclusão e suas formas de manifestação. Diante de tal premissa serão expostas algumas informações sobre a exclusão social, que em seguida será relacionada com a questão do feminino. 
A exclusão social
A exclusão social remonta à antigüidade grega, onde  escravos, mulheres e  estrangeiros eram excluídos, mas o fenômeno era tido como natural. Somente a partir da crise econômica mundial que ocorre na idade contemporânea e que dá evidência à pobreza é que a exclusão social toma visibilidade e substância.  A partir de 1980, os seus efeitos despontam, gerando desemprego prolongado e, parafraseando Castel (1998), os desafiliados do mercado passam a ser denominados de socialmente excluídos. A partir de então, este tema ganha centralidade nos meios acadêmicos e políticos. 

A tradicional exclusão da mulher na esfera do trabalho

No campo do trabalho, a exclusão da mulher não encontra explicação nas conjunturas econômicas, pois suas raízes estão fincadas em matrizes diversificadas, a exemplo dos interesses do patriarcado em manter a mulher distante do patrimônio e numa relação hierárquica inferior, imputando-lhe a atribuição de prestar serviço social gratuito, de importante relevância para a sociedade pensada para o homem. A desconstrução dessa forma de exclusão da mulher e sua integração no mundo do trabalho se dão a partir do século XIX através do empenho e da luta feminista travada na sociedade mundial.
De acordo à narrativa histórica de Michel (1983), a penetração da mulher no mercado de trabalho  se dá pela via da filantropia que é usada pela mulher da classe dominante como reação para sair do isolamento do lar. Segundo a autora, a importância dada à vida familiar e à casa pelas classes médias, desde o século XVII, fortaleceu a ideologia dos papéis domésticos e educativos para o feminino. De igual modo, as mulheres dos meios populares reagem ao isolamento do lar, buscando alternativas de forma coletiva. Assim, saem juntas para exigir a paz, e como domésticas, denunciam ao parlamento seus horários exaustivos, sufocantes, enquanto as comerciantes protestam contra as prisões por dívidas.
Como se pode observar, a quebra do isolamento do lar e a participação da mulher no espaço público se deram por um processo de reações e conquistas que se arrasta até os dias atuais. Até mesmo a sua iniciação no trabalho remunerado, que se deveu a uma necessidade do capital de ampliar o seu consumo, ocorreu de forma desigual, pois ela não foi colocada no mercado apenas na condição de força de trabalho, mas também na de mulher estigmatizada e vítima de relações desumanas na esfera privada. Assim, como observam Bruschini e Rosemberg (1982), a atuação da mulher no mercado de trabalho se dá, até os dias atuais, em condições visivelmente desiguais e excludentes. O preconceito de inferioridade designado ao sexo feminino, durante séculos – através da religião, das leis, da escola e da família, onde, cotidianamente, a própria mulher reproduz a superioridade masculina através da educação familiar ou informal – é apropriado, inclusive, pelo capital e reproduzido nas relações de trabalho pelo mesmo sistema capitalista, que convoca a mulher para o mercado de trabalho remunerado e que a aceita como trabalhadora legítima.
No mercado, dada a sua condição de mulher (paciente, obediente, dedicada etc.),  vende a sua força de trabalho a preço mais baixo: o seu trabalho é considerado ajuda no orçamento familiar; concentra as atividades em setores extensivos do doméstico, a exemplo da educação, saúde, assistência social, enfermagem e têxtil; desenvolve tarefas dificultosas, que o homem, muitas vezes, se nega a fazer; e permanece distante das esferas de comando e decisão entre os próprios trabalhadores.
Na classe dos trabalhadores, a situação de desigualdade se repete. Os preconceitos que favorecem a reprodução de sua inferioridade (mãe, dócil, frágil, dedicada etc.) são apropriados pelos colegas masculinos, que, ao invés de acolhê-la como companheira, parceira, indivíduo, aceita-na na condição particular de mulher (Pateman, 1993).
Na interseção do público e do privado, a desvantagem feminina é total. O homem, de modo geral, ainda continua ausente na divisão das tarefas domésticas. Por não ter conquistado a eqüidade de gênero na esfera privada, ou seja, a participação do masculino nas tarefas da casa, a mulher assume uma carga de trabalho no espaço público semelhante ou mais exaustiva do que a do trabalhador masculino, e no âmbito privado cabe-lhe a responsabilidade da labuta da casa, do preparo do alimento, do cuidado dos filhos e sua educação informal, do cuidado dos velhos da família, da saúde dos familiares e, evidentemente, da reprodução biológica e física da força de trabalho (Bruschini, 1990). A contradição na super exploração das múltiplas jornadas de trabalho desempenhadas pela mulher se constrói no fato de que, mesmo se sacrificando para conciliar as várias tarefas cotidianas, essa trabalhadora descobre na esfera pública a trilha da sociabilidade, possibilitada pelo trabalho coletivo que lhe permite desconstruir preconceitos secularmente designados ao ser mulher e substituí-los por suas reais qualidades. No espaço da sociabilidade do trabalho, ela toma ciência de que pode gerenciar a  própria vida, pode exercer a chefia da família e, através do convívio coletivo, livra-se da timidez, aprende a sorrir e a criar sonhos (Fischer, 1997).
 
Fonte: http://www.fundaj.gov.br/tpd/113.html
Bibliografia
ALAMBERT, Zuleika. Feminismo: o ponto de vista marxista.Nobel: São Paulo, 1986.
BANDEIRA, Lourdes e SUAREZ, Mireya (Orgs.) Violência e crime no Distrito Federal. Paralelo 15, Universidade de Brasília, Brasília:1999.
BARBIERI, Teresita. Sobre a categoria de gênero: uma introdução teórico-metodológia. SOS Corpo, Recife: 1992.
BOURDIEU, Pierre Dominação masculina. Bertrand Brasil, Rio de Janeiro: 1999.
BRUSCHINI, Maria Cristina Aranha. Mulher, casa e trabalho: o cotidiano nas camadas médias paulistas. Vértice, São Paulo: 1990.
BRUSCHINI, M. C. e ROSEMBERG, Fulvia. Trabalhadoras do Brasil. Brasiliense, São Paulo: 1982.
CASTEL, Robert. As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário. Vozes, Petrópolis: 1998.
DUPAS, Gilberto. Economia global e exclusão social. Paz e Terra, São Paulo:1999.
FISCHER, Izaura R. A trabalhadora rural: conscientização na empresa agrícola moderna. Dissertação (Administração Rural e Comunicação Rural) Universidade Federal Rural de Pernambuco, 1997.
GROSSI, Mirian Pilar e PEDRO, Joana Maria (orgs). Masculino, feminino, plural: gênero na interdisciplinaridade. Ed. Mulheres, Florianópolis: 1998.
LAURETIS, Tereza de. The technology of gender. In: Lauretis (org.) Indiana University Press, 1987.
NASCIMENTO, Elimar Pinheiro do. O fenômeno da exclusão social no Brasil. INED n.3, 1996.
PATEMAN, Carole. O contrato Sexual. Paz e Terra, São Paulo: 1993
SAFFIOTI, Heleieth I. B. Eqüidade e paridade para obter igualdade. In: Revista O social em questão. Ano I n.1, jan-jun, 1997.
SAFFIOTI, h, i. b.& AMEIDA, S.S. Violência de gênero: poder e impotência. Revinter, Rio de Janeiro:1995
SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil para a análise histórica. Educação e Realidade, V.20(2), 1995.

                               

Nenhum comentário:

Postar um comentário